Em Brasil que pega fogo, ONGs trabalham para manter a floresta em pé

por Rafael Ciscati e Mônica Nóbrega
Fundo Brasil de Direitos Humanos

Em agosto deste ano, a ONG Maparajuba organizou, em parceria com o Instituto Chico Mendes (Icmbio), uma formação para brigadistas indígenas. Lincon Aguiar, assessor da ONG, me contou que a ideia partiu do Conselho Indígena Munduruku e Apiaká, povos que vivem no planalto de Santarém — a mesma região onde a organização atua. Àquela altura, uma sequência de incêndios florestais já se propagava pela Amazônia brasileira. Desde então, o quadro só se agravou: levantamento do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostra que, desde janeiro, o Brasil registrou mais de 190 mil focos de calor. A pior temporada de queimadas dos últimos 20 anos. 

A atividade promovida pela Maparajuba formou 19 brigadistas voluntários. Treinados em práticas de combate aos incêndios, monitoramento por drone, geolocalização e uso correto dos EPIs, os indígenas Munduruku e Apiaká ganharam autonomia para responder a eventuais emergências que ameacem seus territórios. 

Conto essa história porque a atuação da Maparajuba dá uma mostra de como atuam as organizações não governamentais. Num país que queima, as ONGs — e os povos tradicionais que, muitas vezes, encabeçam essas organizações — trabalham para manter a floresta em pé. Em meio a emergências, as ONGs apontam soluções. 

A Maparajuba é uma das mais de 130 organizações cujo perfil você encontra no Guia de Fontes da Brasil de Direitos. A publicação, disponível online, reúne informações sobre o trabalho realizado por instituições que defendem direitos e estão espalhadas por todo o Brasil. Traz, também, seus dados de contato. Na sua maioria, elas são o que se convencionou chamar de “organizações de base”: grupos com atuação muito focada em seus territórios, cujos integrantes pertencem à comunidade local e que combatem as violações que eles próprios enfrentam no seu dia a dia

Conhecedoras de suas realidades locais, essas organizações são especialistas nas temáticas com as quais trabalham.  Sabem quais problemas afligem suas comunidades e, mais que isso: propõem caminhos para resolvê-los. 

A importância de diversificar vozes na imprensa

No jargão do jornalismo, “fonte” é a organização, pessoa ou documento que fornece as informações necessárias para a realização de uma reportagem. Ao longo dos últimos cinco anos, as organizações que constam no Guia foram as principais fontes da plataforma Brasil de Direitos — um site de notícias e debates impulsionado pelo Fundo Brasil de Direitos Humanos. 

Elas deram entrevistas, publicaram artigos de opinião, contaram suas histórias e compartilharam, conosco, suas visões acerca dos principais debates travados no Brasil. Ao publicar o Guia, queremos compartilhar essa riqueza de conhecimentos e perspectivas. O contato com esses grupos desafiou a Brasil de Direitos, ao longo dos anos, a fazer um jornalismo cada vez mais crítico e diverso (ou assim espero!). Por isso, acreditamos que ouvir o que essas pessoas e organizações têm a dizer fará bem para a imprensa de maneira geral. 

Afinal, para cumprir sua função social de informar com pluralidade, o jornalismo precisa entender que ouvir vozes diversas não é apenas uma obrigação: é uma necessidade. As queimadas, de que falei no começo deste texto, deixam essa urgência evidente. 

A pior temporada de queimadas das últimas duas décadas, que o Brasil enfrenta hoje, dá mostras do quão complexos são os problemas com os quais a sociedade brasileira terá de lidar daqui por diante. Criminosas ou acidentais, elas só se tornaram tão destrutivas porque coincidiram com a seca mais severa dos últimos 70 anos. 

A estiagem recorde, por sua vez, não é mero acaso: há evidências cada vez mais robustas de que a crise climática vem mudando o regime de chuvas no Brasil. Fica cada vez mais evidente, também, que o Brasil não está preparado para enfrentar suas consequências. 

Para cobrir esses eventos com a criticidade que eles requerem, o jornalismo terá de gastar sola de sapato (ou horas ao telefone) conversando com pessoas e organizações que, hoje, pouco aparecem nas páginas dos veículos tradicionais. Só assim, vai conseguir compreender como esses eventos impactam as vidas de pessoas e comunidades espalhadas pelo Brasil. E, só assim, poderá reportar quais caminhos essas comunidades propõem para enfrentar problemas já em curso. 

As organizações que constam no Guia de Fontes da Brasil de Direitos são um bom ponto de partida nessa busca por maior diversidade de vozes. O contato com elas pode ajudar jornalistas a entender, por exemplo, como povos indígenas vêm se organizando para combater a propagação dos incêndios.

Que o Guia seja um instrumento capaz de encurtar a distância entre repórteres e as histórias que precisam ser contadas.

__

Rafael Ciscati – edita a plataforma Brasil de Direitos, site de notícias e debates que conta as histórias de quem defende direitos humanos no Brasil. Formado em jornalismo pela ECA/USP, com especialização em gerenciamento de projetos pela FGV, foi repórter de Época e O Globo.

Mônica Nóbrega – coordena a Comunicação do Fundo Brasil de Direitos Humanos. É jornalista e especialista em comunicação pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e geógrafa pela Universidade de São Paulo (USP). 

Leia também:
Fique por dentro dos assuntos do terceiro setor e ajude nossas campanhas e ações a chegarem mais longe.

Acompanhe-nos nas redes sociais:

logo1lgoo2logo3logo5logo6logo7
Conheça nossas redes sociais.